O segredo está no passo. Com um tênis tradicional, o
calcanhar toca o chão primeiro, e o amortecedor absorve parte do impacto, que é
maior nesse tipo de pisada. Mas, com o minimalista, o peito do pé chega antes,
suavizando o contato, e o choque com o solo é todo assimilado pelo corpo. Um
estudo do professor Daniel Lieberman, da Universidade Harvard, nos Estados
Unidos, sugere que aterrissar com o calcanhar leva o corredor a sofrer mais
lesões por esforços repetitivos. "Dessa forma há uma parada súbita do pé,
e isso gera um pico de força até três vezes maior que o peso da pessoa. Essa
energia extra não existe quando a parte da frente chega primeiro", explica
a professora de biomecânica Sarah Ridge, da também americana Brigham Young
University.
No entanto, optar pelo minimalista da noite para o dia pode
ser perigoso. O ortopedista Rogério Teixeira, do Hospital e Maternidade São
Luiz, na capital paulista, esclarece por quê: o calcanhar tem uma camada de
gordura muito mais generosa que o peito do pé, protegendo esse membro. Quilos
extras também são um problema. "Se você está bem treinado e sem excesso de
peso, o minimalista não causará danos. A questão é que muita gente começa a
correr justamente para emagrecer", constata Teixeixa. "Quem está
acima do peso e não usa amortecimento vai ter uma lesão mais cedo ou mais
tarde", alerta.
A musculatura é outro ponto importante a considerar. O
fisiologista Júlio Serrão, da Universidade de São Paulo, explica que o calçado
minimalista exige bem mais esforço dos músculos do pé e do tríceps sural,
popularmente conhecido como batata da perna. "O corredor suaviza a colisão
com o solo, mas força essa área, já que ela é mais utilizada, aumentando o
risco de lesões", constata Serrão.
Adaptação exige treino e paciência
Quem decide mudar sofre um bocado no início. O preparador
físico Leandro Sandoval, diretor técnico da Life Training Assessoria Esportiva,
diz que o atleta sente muitas dores musculares nessa fase. "Como o
minimalista não protege do impacto, é uma porta aberta para lesões se usado de
forma inadequada." A dica é inseri-lo na rotina aos poucos, em partes do
treino, aumentando o tempo de uso a cada semana.
As principais diferenças
Os efeitos de cada tipo de calçado no corpo
Alinhamento do tronco: Com o minimalista, a coluna fica
reta, enquanto o tênis tradicional inclina o corpo para frente. Para correr, é
importante fortalecer a musculatura das costas seja qual for o tipo de calçado,
porque encrencas nessa região costumam causar lesões no corpo todo.
Joelhos: Na aterrissagem com o calcanhar, a perna fica mais
esticada. Com o antepé, o joelho fica levemente flexionado, evitando panes.
"Isso dificulta que você se machuque", diz Júlio Serrão. O ideal é
trabalhar bem o quadríceps femural, músculo que fica atrás da coxa e sustenta o
joelho no giro do passo.
Panturrilha: Apesar de estressar a musculatura por
sobrecarregá-la na pisada natural, o minimalista melhora a propriocepção - uma
espécie de sistema de sensores neuromotores que reconhecem as mudanças de
movimento e se adaptam a elas. "Quanto mais simples for o tênis, maior
será o estímulo desse mecanismo", explica Rogério Teixeira. A altura dos
amortecedores do calçado tradicional aumenta o risco de torção em pisos
irregulares. "O minimalista dá mais estabilidade", ressalta Leandro
Sandoval.
Gasto calórico : O tipo de sapato influencia pouco na queima
de calorias, isso depende mais do treino e da periodicidade da corrida. Para
quem está acima do peso, o tênis com amortecedor é mais indicado para evitar
sobrecarga nas articulações.
Pés: São os mais castigados pelos minimalistas, que
costumam causar fraturas nos metatarsos, ossos que antecedem os dedos, e no
calcâneo, o osso do calcanhar. São comuns ainda casos de fascite plantar,
inflamação do tendão que passa pela planta do pé. A fase de transição, em que a
pessoa está "reaprendendo" a correr, é a mais arriscada. Mas vale
lembrar que mesmo tênis tradicionais, quando não adequados ao seu tipo de pé,
podem provocar danos.
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